Posts

Showing posts from November, 2021

Todo o ódio da vingança de George Klempton

   Era uma tarde de fúria para George Klempton; acabara de comprar uma pistola na loja do amigo de seu pai, e o tambor carregava exatas três balas, as quais sabia que tirariam a vida do maldito Raphael Bonfort. A arma pesava em sua mão, sentia orgulho de si pois sabia que após o ato se tornaria um homem, um superior, tendo o grande antagonista sob a sola de sua bota. Toda a raiva e todo o ódio que acumulara em seu coração por todos estes anos, provindos das tiranas ameaças de Bonfort à sua querida mãe, esvair-se-iam em três balas de chumbo.    A primeira iria em seu abdome, pois queria vê-lo sofrer. A segunda no peito, para dificultar-lhe a respiração; queria vê-lo cuspir o pútrido sangue. A terceira, certeira na cabeça, mandaria o bastardo para o inferno. Então cuspiria em sua face e o deixaria lá apodrecendo sozinho, pois tanto ele, George Klempton, quanto todo o resto do vilarejo adoraria ver o amaldiçoado cadáver daquele monstro sufocar-se na terra, sem chance de escapada. E assim

O Inconsciente — ou, le temps detruit tout

   O dia tinha começado tão bem...    Estava imensamente preocupada devido a minhas ocupações, estava cansada e queria morrer simplesmente. Mas sabe aquele momento especial que, ainda que curto, muda totalmente o seu estado de espírito? Pois é, veio cedo desta vez. Levantei da cama após dormir alguns minutos, e não podia ter um melhor “push” para iniciar o dia. Ela me desejava uma  ótim a  e produtiv a   manhã. O café não podia ter melhor gosto, e o cheiro de tinta e papel não podia trazer melhores recordações. Eu estava legitimamente feliz. Tudo ia às mil maravilhas. E então começou. Caminhei por alguns quilômetros, resolvi negócios, passei muito tempo na fila do correio, e não podia estar mais cansada como naquele momento em que sentei à minha mesa favorita, em minha cafeteria favorita, e pedi o “de sempre”. A cabeça a ponto de explodir, cada milímetro do meu corpo em um estado anormal de relaxamento; sentia como se estivesse passando por um AVC — há mais de trinta minutos. O café ch

Untitled 03

  I    Numa noite de quarta-feira, cansada, saindo do centro hospitalar e de uma seção de psicanálise, atravesso a rua para a praça escura. A prefeitura da cidade pequena não se importa o suficiente para mandar um ou dois homens para trocar as lâmpadas dos postes que os delinquentes quebraram há um mês atrás, e aquele se torna o ponto mais acessível para ver as estrelas. Sento no meu banco de sempre e olho para cima. Vejo meus finados todos lá, na negritude do espaço, e conto para eles como foi meu dia; ora ou outra o discurso cortado pelos barulhentos ônibus cobertos de poeira. Eles me escutam e respondem no seu código morse que nunca me importei em aprender, até que canso e deixo que falem sozinhos. O dia é o único que consegue calar seu assunto incessante e silencioso.    O tempo passou rápido. Mamãe ligando para saber onde estou, mas não quero responder. Deixo vibrar no bolso o celular, agora deitada no banco duro e desconfortável. Bem longe escuto um choro . Penso vir de um dos pr

entrevista com mendigo em troca de meia lata de cerveja

  "Eu não me mato porque não quero me matar. Quem é que pode se matar com tanta pinga no mundo?" entrevista com mendigo  em troca de meia lata de cerveja Q. Aquela tenda ali  é sua? Quanto custou? R. Os grão finos desses prédio aí da frente me deram a barraca pra morar pra não ficar aqui de dia. Q. Fica aonde, então, quando é dia?   R. Zanzando por aí pedindo grana, entrando no mercadão ali quando tá muito quente porque lá é sempre geladinho. Rico é igual pinguim, só gosta de frio e frango.   Q. Com o verão aí até as noites ficaram mais quentes. Como lida com o calor? R. Tem gente lá no mercadão que só me ignora. São pago pra tirar   mendigo de lá não, e o estacionamento fica aberto o dia todo. Q. O que come? Como bebe água? R. O pessoal lá de baixo divide comida com nós aqui de cima [...] Água aqui só nos banheiros ali, ó. Mas eles tranca em dia de semana, só abre sexta. Aí nós vai pro mercadão de novo.   Q. Você gosta da vida aqui? R. Não tem porque não gostar. Foi o que de

Priscilla II

     "Ela é um  su permercado. Experienciá-la é como fazê-lo a um supermercado. O ar congelante do AC, os milhares de produtos diferentes, a resposta para todos os problemas, mas mais ainda, o terror da modernidade corporativa, fria e dura como mármore ", foi o que pensei enquanto balançava seus A cups para um detector de fumaça.    — Não é engraçado que alguém se excite p ela mera visão   de  image ns  em movimento presa s  a uma tela? — Ela p erguntou.    — Ainda é uma evolução. Houve uma época em que o homem tinha nada além de um cartão-postal porn ô  por toda a vida , — R espondi.    — Vamos mostrar para o eles do que a modernidade é feita. Tire as roupas.    — Acho que só você já está bom. Você e a superfície plana  que chama de peito.    — Você nunca reclamou da minha superfície plana . Talvez seja mesmo o suficiente ,  — Abaixa a camisa .  — Ou será que ele prefere peitões?    — Quem disse que é "ele"? Talvez seja uma senhora.    — Uma senhora já teria vindo

fucking whore dentist bitch monster

     Four goddamn years without going to the dentist. Afraid, so afraid, I'm the grown up reflection of the child crying out loud because he doesn't want that small figment of pain from the needle piercing the gum, the motorized little drill digging a hole on the aching tooth.    I feel like a child in the zoo, except that I am as much a visitor as I am an animal. An animal like all my colleagues on  death row, in line for the inevitable doom that lies at the bottom of the abyss. Afraid of le plus laid, plus mechant, plus immonde, the delicate monster: the dentist.    Neither the television showing cartoons, nor the fashion maga z ines over the table, nor the plants in every corner, nothing help ed  the morbid sensation of despair those white lights were giving me, reflecting off the white furniture, off the white floor, off the white walls, off the white woman behind the counter. And my toothache becomes a headache, and I can’t keep my eyes open, a nd it was hell on Earth, on

THE LOST TAPES Vol. 5

   The big tittied lady    I see everyday    Got twenty years older    This last holiday   ***    Now that girl comes to mind.    The one with the long, black pants.    Only the longest and blackest of pants    To fit the tallest and prettiest of girls. ***    A punk meet-up in front of the mall.    Man, how I miss being a child!   ***    — Your books arrived, Anastasia.    — Thank you, good sir. How much do I owe you?    — Half-a-dozen lollipops and a kissy on the cheeky.   ***    Thug life,    Drug dealers and gang bangers.    The sound of a cartoon coming from the house    The banging sound of a fist hitting the door.    Window open, curtains floating in the wind. ***    Pungent smell of tuna and goat cheese    Dry texture of old bread    Sweet smell of wine    Last dinner      The omen of the rain outside    His life like a puddle the devil jumped in   ***    spirit bonding    touching hands    zen music    10 kilos of paper to get through    I love my job   ***    Box-duck-woman,

Gala

   A gala party. Masked faces everywhere .    My beautiful black dress ,    Their shimmering costumes .    My boredom amongst the rich ;  the contemplation of what money does to one's taste.    Champagne refills from every garçon j ’ai  vu devant moi .    Tipsy and complaining in what I think is a silent tone ,    The conversation groups complaining about me ,    And they know I know ,    And I pretend I don't .    I pretend the murmur cannot be heard through the calm piano on the background ,    And I know I can't just go fetch my boss and implore him to take me home.    He's not my dad.    I don't even have a dad.    I'm just a n   e scort looking for a pimp to adore and,    Hell! I wish I had a double jumbo slurpee cup to fill with champagne.      I slur back to the dining room .    Back to the dry fish and politics .    Back to the "For Christ's sake, Annie ,   d on't embar r ass me .    I know you don't wanna be here, but you're my only

Monster Society

     Monster Society is the name of this band I found in the good-old Google+ times. They managed, somehow, to send e-mails to every single youngling in the small town we lived in, promising that, if we came to their first show, we’d live an unforgettable experience. Surprisingly enough, only a fistful of people showed up, and even in the open the smell of hairspray was strong. We all met in front of an abandoned house said to be the main stage, although not a single life form was on sight. Supposed to begin at 03:00AM, it only actually started an hour later, now with less than half the crowd that first showed up. I don’t think they wanted a life-changing experience.    Way too loud, an electric guitar started screaming from inside the house, a close-to-unbearable noise followed by the sound of a chainsaw that tore a hole on the rotten wood of the garage door, letting us see the poorly-lit juggalo skinheads that could barely manage their instruments. One of them was distorting the soun

no ponto de ônibus

     Sentada no ponto de ônibus esperando o meu chegar, veio um homem atravessando a rua em minha direção. Maltrapilho ele, malcheiroso também, trazendo consigo a nuvem do miasma alcoólico. Olhos fixos em mim, já previa o que iria acontecer.    Dobrando-se a minha frente. "Olá, doutora, bom-dia. Perdão atrapalhar." E fez o mesmo com as duas outras pessoas sentadas ao lado, pedindo dinheiro a elas antes de se voltar a mim novamente e começar sua história.    "Ô, doutora, desculpa interromper sua leitura, mas vou te falar a verdade, estou precisando de um dinheiro."    "Que tipo de dinheiro, amigo?"    "Olha, você sabe como carne tá cara, né? E assim, eu trabalho, eu ganho um dinheirinho cá e lá todo mês, mas lá em casa mal-mal tem ovo pra comer."    "É verdade, tudo está caro no mercado."    "Aí, doutora, você entende minha situação. Eu te peço, humildemente, que me dê um trocado qualquer pra ajudar com o dinheiro lá em casa. Se tiv

La Fleur Morte p.1

     Desde pequeno adorei flores. De todos os tipos e todas as cores. Minha flor era uma bela margarida num vasinho na janela, a qual regava todos os dias. Todos os dias sentia a mesma fragrância suave e a maciez de suas pétalas. Seu tempo de vida foram dois meses de primavera; o caule no lixo e as pétalas secando sobre a escrivaninha, onde as podia ver. Em menos de uma semana estavam secas e frágeis. O branco dando lugar a um seco marrom com cheiro de nada; lindas como nunca antes. Despetalar flores tornou-se um hobby, e logo vieram outras. Tulipas, rosas, petúnias. A floricultura como um açougue; a carne, a arte, o desejo pela falha da vida. As sementes e o fazer viver; quanto mais tempo aguardasse melhor a sensação no assassínio. O vaso um leito, onde se nascia e onde se morria; a velha escrivaninha de carvalho escuro a mesa mortuária, as flores o experimento. Qual tipo o mais resistente? Qual o mais cheiroso? Quais as melhores texturas? De flor em flor, de pergunta em pergunta, dúz

THE LOST TAPES Vol.4

(a third repost of the twice deleted archive, but now translated!) PT.: [...]A cada minuto tento replantar a semente do “voe abaixo do radar, ninguém precisa saber que você existe” em minha cabeça, mas tudo o que quero, tudo o que sempre quis, era ser alguém normal, com objetivos de vida, com a vontade de viver e fazer mais, de ser O algo superior; apontar o dedo para alguém e dizer o que realmente sinto. ENG.: [...]Every minute I try to replant the seed of the “fly under the radar, no one needs to know you exist” in my head, but all I want, all I’ve ever wanted, was to be someone normal, with life goals and the will to live and do more, the will to be superior; point at someone and say what I really feel. *** PT.: I Veja a mente. O que houve com o espaço ao redor?   Palpitações... Fortes... Fortes... Mais fortes... Ainda mais fortes A visão turva. O que está acontecendo? Se... Será... Será que... Céus! Doçura, Profunda doçura, Doce doçura. Perte.   Palavras saem da boca Mas o que quer