Posts

Showing posts from May, 2021

O Gaiteiro

[Essa versão está bastante datada (11/23) e permanece aqui somente para arquivo. O trabalho foi reescrito e virá de conjunto a um novo projeto.]    Acabava de sair da casa de um amigo tarde da noite, pois não queria que fosse embora antes da chuva passar. Falamos nossos adeus e me observou descer a rua me guardando com o olhar. Chegando na esquina tinha duas opções: ir para casa explicar meu desaparecimento, ou vadiar pelas ruas escuras e molhadas da cidade. Decidi aumentar a preocupação de mamãe que certamente esperava acordada, e fui caminhar para ainda mais longe do lar.  Sempre adorei os bairros de classe média alta, cheios de casas largas com flores, decorações em cerâmica e pintura da cor mais destacável possível em cada uma. Sempre tinha asfalto e calçadas rachadas e campainhas para tocar e correr. O comércio local se dividindo entre bares para os mais pobres, outros para os mais ricos, floriculturas e lanchonetes das mais diversas. A salgateria do tio D. vendia as...

Untitled 01

Para Sofia, uma das minhas pessoas favoritas.   I  Ela caminha o mais rápido que pode. Não por ter pressa, mas pelo medo de a notarem. Não quer ser vista, mas Papai Noel nunca trouxe sua capa de invisibilidade. Sua única esperança é a velocidade, mas sempre num passo polido o suficiente para não a acharem louca. Ela caminha o mais rápido que pode mas não vê o fim, ainda está a mais de três quilômetros de seu objetivo e esse fato consome sua força de vontade numa cadência veloz, e o desejo de correr pela sua vida, agora já a dois blocos de sua casa, é indizível. O coração bate rápido num tum-tum cada vez menos ritmado, os pulmões parecem pesar toneladas, e não importa o quão rápido aspire, o oxigênio nunca parece suficiente. Ela vira a esquina, cola as costas na parede e olha em volta. A claridão do dia faz doer os olhos e não consegue enxergar as casas, que se unem num só borrão branco como o paraíso. Ela teme que Deus a veja nesse estado. O suor escorre mas não sente calor, u...